'Se as coisas são inatingíveis...ora! Não é motivo para não querê-las... Que tristes os caminhos, não fora a mágica presença das estrelas!" (Mário Quintana)
 

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quinta-feira, abril 29, 2004
Refletindo...
Certa vez, li um depoimento de uma garota paraplégica que despertou muitas reflexões em mim. O tema principal do depoimento era a maternidade. A história era a seguinte: a garota resolvera ter um filho. Solteira, sem namorado, desempregada e, se não me engano, morando numa cidade longe da família. Por sua decisão, foi chamada de louca, irresponsável e outros adjetivos hostis. O que mais me chamou a atenção foi o fato de ela frisar que a julgavam assim, louca, por ter resolvido ser mãe mesmo paraplégica, e que as pessoas chegavam a questioná-la como ela podia ser tão irresponsável. Fiquei chocada. Pensei: "nossa! como as pessoas podem ser tão cruéis?". Pensei em minha própria experiência: quando engravidei pela primeira vez, a família e todos os amigos ficaram em festa, assim como se entristeceram pelo aborto involuntário. No nascimento de Ricardinho a festa foi maior e, agora, nessa nova gravidez, maior ainda. Nunca ouvi comentários que não fossem elogios, carinho, parabéns. Questionei-me : "Por que reações tão diferentes, diante da mesma situação?"
Li esse texto, numa época em que estava começando a me informar sobre as experiências de outros deficientes e quase tudo que eu lia me chocava, pela total distância dos relatos com minhas próprias experiências. Desde então, venho aprendendo e amadurecendo constantemente. Aprendi a filtrar o que leio, a separar o exagero, o rancor, o joio do trigo. Hoje, refletindo melhor sobre aquele depoimento penso :"Será que as situações, minha e da garota, eram realmente semelhantes?", "Será que se eu tivesse resolvido engravidar solteira, sem fonte de renda, essa gravidez teria sido comemorada?". Com certeza não. Tenho uma irmã que foi mãe solteira aos 20 anos e a notícia de sua gravidez foi uma bomba. O pai da criança não quis se casar, ela estava desempregada e não vivíamos uma situação financeira tranqüila. Num primeiro momento, todos ficaram preocupadíssimos e só enxergavam a irresponsabilidade dela, embora ela não tenha engravidado propositadamente. Acho que essa situação se repete em todas as famílias que passam por situação parecida e é natural pensarmos nos problemas primeiro, nas dificuldades. Então, refletindo mais, cheguei à conclusão de que talvez o rancor, a dor pelos preconceitos e discriminações antes sofridos, tenham levado aquela garota a achar que a opinião das pessoas sobre sua gravidez se referisse somente a sua condição física, quando na verdade, poderia ser sobre tudo que a envolvia naquele momento. Claro que acredito que existam pessoas maldosas capazes dos comentários mais cruéis, mas também creio que a opinião desse tipo de pessoa jamais deva ser levada em consideração.
Sempre que leio algo do tipo "eles não ligam porque não são deficientes!", sinto uma dose elevada de hostilidade contra as pessoas que não possuem deficiência. Dá a impressão de que algumas pessoas colocam sua deficiência à frente de tudo de desagradável que lhes acontecem e tudo ganha uma dimensão maior do que realmente é. Não consigo compreender isso. Jamais vi alguém sem deficiência como "potencial inimigo", aliás, jamais dividi o mundo em "deficientes" e "não deficientes". Acho natural olhares curiosos e até mesmo perguntas absurdas, pois todos somos curiosos por aquilo que conhecemos pouco ou desconhecemos. Todos nós temos algum tipo de preconceito e isso só é revertido quando conhecemos a realidade de perto, quando convivemos com aquele que pré conceituamos. Pré julgamos as pessoas pelas roupas que usam, por sua origem, por escolaridade, religião etc., mas quando o preconceito vem em nossa direção viramos feras, como se fôssemos santos e os únicos a sofrerem tal coisa. Ao contrário de nutrir rancor por alguém preconceituoso, prefiro entender o preconceito como fruto da falta de convivência, de informação real que leve as pessoas a basearem-se em fatos e não em suposições à formulação de seus conceitos. Diante disso, me vejo como parte importante e responsável no processo de luta contra preconceitos, afinal, não há ninguém melhor para mostrar como as coisas são de fato do que o próprio sujeito que sofre com suposições e falsas verdades, e tento expor-me o máximo possível, física e virtualmente, para atuar nesse processo.
O rancor e hostilidade não levam à coisa alguma, mas a convivência e a informação são armas poderosas na transformação de pessoas.

terça-feira, abril 27, 2004
Reinações de Ricardinho
Benê dando banho no filhote e não dando a mínima para o que ele falava:
- Papai!! Você não me escuta????
- Eu te escuto do mesmo jeito que você costuma me escutar.
- Ah, não! Assim não quero!


quinta-feira, abril 22, 2004
Colecionando Milagres
Uma das coisas que ouvi durante os cumprimentos de meu casamento e que me marcou veio de um tio:"o que assiti hoje foi um milagre!". Na hora achei aquilo tão absurdo, pois sabia que ele estava se referindo ao fato de eu, apesar de paraplégica, ter me casado, contrariando a expectativa de todos que já me viam numa vida solteira e solitária.
Hoje, quase 13 anos depois, concordo que meu casamento foi mesmo um milagre, não segundo a visão de meu tio, mas sim, pelo amor contido entre mim e Benê. Num mundo onde o individualismo e a solidão parecem prevalecer, ser feliz casada é mesmo milagre, milagre do amor. Milagre tão grande que deu fruto, um fruto chamado Ricardo Luís, considerado por mim como "Presente de Deus". Mais um milagre em minha vida e, mais uma vez, não por eu ser paraplégica, pois há inúmeras mulheres sem deficiência física que não conseguem ser mães, mas sim outro milagre do amor.
Puxa! Dois milagres concedidos! Virei colecionadora de milagres.
Mas, Deus achou que dois milagres ainda não eram suficientes e decidiu presentear Ricardinho, fruto do milagre do amor, também com um milagre: um irmão.
Sim, àqueles que ficaram em dúvida, tem mais um reinador a caminho! E, se a vontade de Ricardinho for cumprida totalmente, será uma reinadora.
Estou ainda no início da gravidez, no segundo mês, tirando o enjôo, tudo está tranquilo.
Mais uma vez, reparti com os amigos minha alegria e recebi uma enxurrada de carinho. É indescritível a emoção de ler o carinho de todos, expressos aqui nos comentários e também por e-mails. Obrigada!!
Estamos, Benê, Ricardinho e eu, muito, muito felizes.
Agora, entro numa nova versão: Tchela versão crescente.

terça-feira, abril 20, 2004
Sem palavras
Tenho uma super notícia a dar, uma surpresa. Como até eu fui surpreendida, acabei ficando sem palavras. Então, decidi usar palavras alheias emprestadas para contar a vocês:
Ao que vai chegar
(Mutinho e Toquinho)

Voa, coração
A minha força te conduz
Que o sol de um novo amor
Em breve vai brilhar
Vara escuridão
Vai onde a noite esconde a luz
Clareia seu caminho e ascende seu olhar
Vai onde a aurora mora
E acorda um lindo dia
Colhe a mais bela flor
Que alguém já viu nascer
E não esqueça de trazer força e magia
O sonho e a fantasia
E a alegria de viver

Voa, coração
Que ele não deve demorar
E tanta coisa mais quero lhe oferecer
O brilho da paixão
Pede a uma estrela pra emprestar
E traga junto a fé
Num novo amanhecer
Convida as luas cheia, minguante e crescente
E de onde se planta a paz
Da paz quero a raiz
E uma casinha lá
Onde mora o sol poente
Pra finalmente a gente
Simplesmente ser feliz



Suave
(Jorge Vercilo)
Você está
em minhas mãos
e do amor
eu não sei o que fazer

Vive a crescer
no coração
como raiz
que se alastra e quebra o chão

Quem, agora está
nas mãos de quem?
Que doce ironia
querer bem!

Você está dentro de mim
onde o amor
faz divisa com a paixão,
um oásis no sertão,
meu tesouro tão sem fim
O que guardo de maior
do melhor que há em mim

Você está
dentro de mim
nesse momento
eu me sinto engravidar

Desse luar,
desse jasmim
É tão suave
que eu custo a acreditar

E nada que eu diga
te reflete
Mar iluminado
no poente

sexta-feira, abril 16, 2004
Santa Santa Casa
Era meu aniversário, fevereiro de 2003, um domingo. Benê e eu íamos nos encontrar com um grupo de amigos num shopping. Já lá, num acidente besta, levei um grande tombo de minha cadeira de rodas, caindo de quatro e batendo os joelhos no chão. Como não tenho sensibilidade nas pernas, na hora nem pensei que algo sério pudesse ter acontecido. Na segunda-feira meu joelho esquerdo estava imenso. Ainda sem querer acreditar que poderia ser algo sério, disse ao Benê que esperaria até o dia seguinte, se não melhorasse iria ao Pronto Socorro. Na terça à noite estava ainda mais inchado, não tive como escapar e lá fui eu ao PS mais próximo de casa. No PS não havia ortopedista de plantão. Isso mesmo, nem nesse nem no outro único hospital de Guarulhos que atendia por meu convênio. O médico que me atendeu, que parecia ser residente, olhou meu joelho e disse que não parecia ter fraturado (talvez tivesse olhos de raio X), mas que eu poderia tirar uma radiografia e mostrá-la no dia seguinte ao ortopedista, que só trabalhava das nove ás dezoito. Tirei a radiografia e fui embora, decidida a procurar um médico em São Paulo. Começou aí uma série de absurdos pelos dias que se seguiram.
Como Benê trabalha nas Perdizes fomos a um hospital próximo de lá, assim depois ele poderia me deixar na casa de minha tia e ir para a PUC. Assim que o médico viu a radiografia que levei falou :"quebrou!". Quase tive um treco quando ouvi isso. Um outro médico apareceu, olhou a radiografia e os dois juntos descartaram qualquer possibilidade de cirurgia, pois, devido a osteoporose avançada em minhas pernas, não teria como fixar parafusos no osso. Mandaram-me para a sala de gesso para colocar uma tala e ficar com ela até a quarta-feira seguinte, quando um outro médico, especialista segundo eles, iria me examinar para ver o que poderia ser feito no meu caso. Saí de lá arrasada. Como ficaria uma semana inteira com aquele gesso na perna, sem poder sequer ir ao banheiro sozinha? Teria de depender de pessoas para tudo. Como previa, foi uma semana longa e difícil.
Enfim, a quarta-feira chegou e voltei ao hospital. O tal especialista não estava e foi um terceiro médico quem me atendeu. Ele já estava a par de meu caso e mandou trocar a tala por outra (aquela estava completamente frouxa e sem função) e tirar novas radiografias. Quando a tala foi tirada, entrei em pânico, minha perna estava mais esticada do que costumava ser, encostando a parte de trás completamente no colchão, o inchaço havia se concentrado na parte de cima do joelho e estava vermelho e escuro. Olhei para Benê desesperada e comecei a chorar. A garota do gesso tentou me tranqüilizar dizendo que não tinha como saber se estava pior só olhando, que a radiografia mostraria e só o médico poderia dizer. A perna era minha, eu a conhecia e sabia que estava diferente do que era, não precisava de radiografia pra saber. Radiografias tiradas, voltei à sala do médico. Ele as olhou, disse que não havia ocorrido desvio na fratura e que aquele tal especialista queria me ver, mas ele só estaria no hospital na segunda-feira (era uma quarta), que eu voltasse na segunda ou fosse ao consultório particular dele no dia seguinte. Com um sorriso, um "fique tranqüila que o osso vai colar!", dispensou-me, com a tala de gesso na perna, como quem se livra de um grande problema.
Saí de lá revoltada e completamente perdida. O que faria? Aonde iria? Onde buscar ajuda de quem realmente soubesse me tratar? Pensei na AACD, afinal eles tem um hospital super modernizado e são especializados em deficientes físicos. Benê eu fomos para a casa de minha tia e de lá liguei para AACD, toda confiante de que seria ajudada. Decepção, não faziam atendimento de emergência, teria de marcar uma consulta para dali a três meses. A sensação de desamparo aumentou. Então, lembrei-me do que um amigo havia me dito uma vez "A setor de traumatologia da Santa Casa de Misericórdia é um dos melhores que existe!". No mesmo instante liguei para lá e me informaram que, por possuir convênio, seria melhor ir ao Hospital Santa Isabel, parte particular da Santa Casa, coincidentemente o hospital onde meu filho nascera. Fui confiante de que minha angústia acabaria. Acertei! O atendimento lá foi bem rápido. O médico que me atendeu, após me ouvir e olhar as radiografias, pediu licença para chamar um outro médico, Dr. Rodrigo Montezuma, especialista em casos assim. Senti segurança assim que o vi. Sem qualquer dúvida, foi logo dizendo que a solução seria a cirurgia e que a osteoporose não era problema algum, pois existia até um cimento de osso para ser usado caso necessário. Explicou-me que, caso eu optasse pelo gesso, a fratura demoraria meses para colar e que meu joelho endureceria e jamais voltaria a dobrar como antes, mesmo com muita fisioterapia. Já com a cirurgia em 15 dias estaria liberada e não teria o incômodo de ficar com a perna dura. Finalmente tinha encontrado ajuda de quem realmente sabia como lidar com meu problema. Concordei com a cirurgia e tive que ser internada no mesmo instante, para entrar como emergência e evitar burocracias com o convênio e o hospital. Foi um sufoco, tinha saído de casa às dez da manhã e não voltaria antes de três dias! E meu filho? Como ficaria sem ele e ele sem mim? Não tinha opção. Pouco depois fui internada e a cirurgia marcada para o dia seguinte. Liguei para um, para outro, sempre na maior choradeira. Estava com medo, a maior cirurgia que já tinha feito tinha sido a cesárea para o nascimento de meu filho, agora tomaria anestesia geral e colocaria uma placa e parafusos na perna. Passei a senha de meu blog a minha amiga Mary e pedi que escrevesse um post avisando meus amigos da cirurgia. Outros amigos foram avisados por e-mail por minha irmã. Essa parte foi muito legal, pois recebi tanto carinho e envio de força, pelos comentários do blog, que, mais uma vez, vi o quanto a Internet une as pessoas e dissemina coisas boas.
Cirurgia feita, fiquei platinada e até ganhei de um amigo blogueiro o título de Super Tchela Versão Platinum. Tudo correu muito bem, melhor até do que o Dr. Rodrigo esperava. Os parafusos ficaram bem fixos, mesmo com o alto grau de osteoporose (ele disse que o osso chegou a esfarelar durante a cirurgia). Foram 4 dias de hospital, que valeram uma perna salva. Recuperei-me rapidamente, sem qualquer complicação.
Doutor Rodrigo Montezuma e sua equipe, mostraram-me que há um lugar onde podemos buscar ajuda quando precisarmos, um lugar onde os médicos são altamente competentes e seguros e não fazem de seus pacientes cobaias: A Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Por isso, desde então, eu digo: "Santa Santa Casa!"

segunda-feira, abril 12, 2004
Reinações de Ricardinho
- Filhinho, vou jogar esse papel da revista Recreio fora.
- Não!!!
- Por que não? Não serve pra nada.
- Eu te dei autorização pra fazer isso???? Sua xeretófira!


sexta-feira, abril 09, 2004
Páscoa
"Este é o dia que o Senhor fez para nós;
alegremo-nos e nele exultemos"


A Páscoa é a festa mais importante para aqueles que crêem em Cristo. É a grande festa da Ressureição, da renovação da vida, da esperança.
É o momento de refletirmos sobre nossas condutas, nossos pensamentos, nossos egoísmos, nossas vidas e nos renovarmos, descartando tudo de ruim que há em nós, para que nos tornemos pessoas melhores.
A Páscoa não é almoço em família, nem troca de ovos de chocolate, não. Páscoa é crer que Cristo reviveu e vive e, diante disso, assumirmos o compromisso de vivermos a ressureição todos os dias e nos levantarmos sempre dos tombos da vida, não nos permitindo ficar, jamais, no chão.

Feliz Páscoa a todos, viva e renovadora.

quinta-feira, abril 01, 2004
Reinações de Ricardinho
Mamãe, papai e filhote jantando:
- Filhinho, beba sua água que faz bem.
- A água se transforma em sangue, né mamãe?
- Isso mesmo, filhinho.
- A comida também vira sangue, né mamãe?
- Também.
- Como é que isso tudo se transforma em sangue?
- É que o nosso corpo é como uma máquina e cada parte tem uma...(procurando uma palavra que substituísse "função", por achar que ele não entenderia)
- Cada parte faz uma coisa diferente - completa Benê.
- Ah! Cada parte tem uma função!
- É...(com cara de boba)
- Filhinho, e qual é a função da mamãe? - pergunta Benê.
- Me adorar!